GT - SENTIDO DA VIDA [Parte 1]

Discussão em 'Contos' iniciado por AziRESPEITA, 25 Maio 2018.

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  1. AziRESPEITA

    AziRESPEITA Neutro
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    GT DO SENTIDO DA VIDA
    Anões, esse GT vai ser grande pra caralho
    AVISO: Apesar de parecer, esse GT não é mais uma história romântica clichê, confie em mim.
    PRÓLOGO:
    >oi, eu sou o… bem, isso não importa
    >tudo o que você precisa saber é que minha vida é um saco
    >eu tenho depressão
    >mas não como esses frutinhas, suicidas de facebook
    >eu realmente tinha depressão
    >uma vez um professor meu com quem eu conversava muito me disse que eu tinha um tal “niilismo existencial”
    >é o nome para o que eu sinto
    >mas essa história não é sobre isso
    >é sobre como minha vida mudou para sempre
    >era uma sexta-feira qualquer de 2004
    >eu tinha 16 anos e era o meu primeiro emprego
    >eu trabalhava em uma locadora
    >meu sonho era ser um cineasta
    >por enquanto, aquele era o melhor emprego para mim
    >eu ficava o dia inteiro assistindo filmes
    >as vezes eu precisava parar para atendente clientes
    >mas nada que me incomodasse, afinal é o meu trabalho
    >em um desses dias, uma garota apareceu lá
    >ela era bonita, bem bonita, mas eu não dei muita atenção para isso
    >era só mais uma cliente, já passei da fase de me apaixonar por pessoas aleatórias que nunca vou ver outra vez
    >enfim
    >faltava apenas 7 minutos para eu fechar a locadora
    >algumas pessoas, principalmente mulheres, amam demorar pra caralho enquanto escolhem um filme
    >então eu não só não liguei para a beleza dela, como não gostei que ela aparecesse
    >tava pensando o quê?
    >que eu ia olhar os lindos cabelos loiros dela, os olhos azuis e a pele clara e lisa, e sentiria uma atração inexplicável por ela?
    >vai tomar no cu
    >isso aqui não é um livro adolescente
    >para minha surpresa ela foi bem rápida
    >pegou três DVD’s
    >isso era bom
    >não pude deixar de notar que ela trocou os adesivos dos DVD’s por outros
    >caso você seja um juvenil de bosta, deixa eu explicar:
    >em algumas locadoras os DVD’s tinham adesivos
    >cada adesivo tinha uma cor, na minha locadora eram 3
    >o adesivo dourado, o prata e o vermelho
    >o dourado era 9 reais, o prata 6, e o vermelho 3
    >quase não tinham DVD’s com adesivos dourados
    >a maioria era vermelho, e alguns pratas
    >quanto melhor fosse o filme, mais chances do adesivo dele ser dourado
    >quando ela trouxe os DVD’s, logo saquei tudo
    >ela não sabia, mas eu conhecia praticamente cada um daqueles filmes
    >ela tinha pego 3 filmes bem antigos
    >Luzes da Cidade, Cantando na Chuva e Último Tango em Pariz
    >TODOS OS TRÊS ERAM DVD’S DE ADESIVOS DOURADOS
    >estavam com adesivos vermelhos
    >ela sequer se deu ao trabalho de disfarçar, colocar pelo menos um dourado
    >se fossem ao menos prata, mas vermelhos?
    >um filme com Charlie Chaplin, outro com Genne Kelly e outro com Marlon Brando
    >TODOS OS TRÊS VERMELHOS? AH, VSF!
    >eu tive que prender a risada
    >- dá 27 reais, moça – eu disse, colocando em uma sacola
    >- não, dá 9 reais! - ela respondeu
    >- daria, se fossem filmes com adesivos vermelhos.
    >ela apontou para um dos DVD’s, motrando o adesivo
    >- eu vi você trocando os adesivos
    >- eu não tr…
    >antes que ela terminasse eu apontei para uma câmera
    >depois apontei para o monitor no meu balcão
    >ela se calou, ficou meio sem graça
    >ela ficou MUITO sem graça, na verdade
    >- olha, eu não queria te constranger, mas…
    >- não, tá tudo bem, desculpa por isso.
    >porra
    >ela realmente parecia muito bolada
    >ou era uma ótima atriz
    >o que não me surpreendia, já que era aparentemente uma cinéfila
    >porra de novo
    >eu realmente fiquei com pena dela
    >- tá tudo bem, ninguém precisa saber… - eu disse, piscando o olho para ela
    >ela me olhou estranho, acho que não tinha entendido
    >- humm, vejamos o que temos aqui… - eu disso ironicamente, olhando para os DVD’s – olhe só! 3 DVD’s com adesivos vermelhos.
    >ela riu
    >o sorriso dela era lindo
    >- são 9 reais, moça.
    >ela tirou o dinheiro da bolsa
    >eu entreguei a sacola para ela
    >- posso saber em quais DVD’s você colocou os adesivos dourados?
    >ela não respondeu
    >agora tinham 3 filmes horríveis custando 27 reais na nossa locadora
    >- tá bem… já tem cadastro?
    >- Ágata Vila-Flor
    >- humm, vida longa à Portugal! - respondi ironicamente enquanto procurava no computador
    >ela estava devendo outros 13 filmes
    >puta que pariu, qual é o problema dessa garota?
    >eu simplesmente ignorei, não sei dizer o motivo
    >- tudo bem, você tem o final de semana inteiro
    >- obrigado – ela respondeu, e foi embora
    >mas antes que ela passasse pela porta, eu chamei sua atenção novamente
    >- como você sabia?
    >ela se virou para mim
    >- sabia o quê?
    >- como você sabia que eu não ia falar dos 13 filmes que você não devolveu?
    >ela simplesmente sorriu e foi embora
    Depois do fim de semana…
    >segunda-feira
    >aguardei ela chegar para entregar os DVD’s, mas ela não apareceu
    >é claro que eu esperava por isso
    >na hora de fechar, pensei em esperar um pouco
    >no dia que ela tinha pegou os DVD’s era bem tarde
    >mas depois de dez minutos eu desisti e fui embora
    >terça-feira
    >eu pensei que talvez ela aparecesse
    >mas acho que ela não estaria disposta a pagar multa por atraso
    >quer dizer, ela não tinha nem 27 reais para os 3 filmes que pegou naquela noite
    >imagina pagar a multa de atraso de todos os 13 filmes?
    >era um real por dia, e o primeiro filme que ela alugou foi há 1 mês
    >fico me perguntando como meu avô deixou isso acontecer (era ele que tomava conta da locadora antes de mim, na verdade a locadora é dele)
    >agora ele está muito doente pra isso, mas não vem ao caso
    >quarta-feira
    >eu já tinha desistido
    >ela definitivamente era uma ladra de filmes
    >ainda assim algo me fez esperar 10 minutos novamente
    >eu sentia que ela apareceria... senti errado
    >desisti e fui emborra
    >à noite, nenhuma novidade
    >apenas eu trancado no meu quarto assistindo uma sitcom para amenizar meus problemas psicológicos de merda
    >durante a manhã eu estudava
    >no colégio a professora de Português me passou uma atividade
    >eu tinha que fazer a resenha de um livro
    >ela escolheu um livro para cada aluno
    >mas não os entregou
    >era para a gente arranjar os livros
    >um sortudo ficou encarregado de fazer a resenha de Eu, Robô
    >eu manjo muito de ficção científica
    >mas fiquei encarregado de fazer a resenha de um livro chamado 1984
    >de um tal de George Orwell
    >não conhecia, mas ela falou que era um misto de romance com ficção científica
    >que merda
    >eu procurei pelo livro na biblioteca do colégio, mas não encontrei
    >agora eu tinha que achar essa porra
    >tinha uma biblioteca perto do colégio, provavelmente eu o encontraria lá
    >do colégio fui direto para a biblioteca
    >chegando lá, algo intrigante aconteceu
    >eu encontrei ninguém menos do que ela: a ladra de filmes
    .
    >eu me aproximei dela, ela ainda não tinha me visto
    >estava folheando um livro de frente para uma prateleira
    >- você também rouba livros? - perguntei, a pegando de surpresa
    >ela continuou de costas para mim, e colocou o livro de volta na prateleira
    >- você demorou de me achar! - ela disse, se virando
    >- você queria que eu te encontrasse? - eu perguntei, intrigado
    >- claro que não! - ele negou, com um tom de deboche – mas eu sabia que você iria tentar.
    >- se quer saber, não te encontrei aqui intencionalmente.
    >- não?
    >- não, preciso pegar um liv…
    >nesse momento eu percebi que o livro que ela colocou na prateleira era justamente o que eu estava procurando: 1984, de George Orwell
    >ela percebeu que eu fiquei olhando para ele, então ela o pegou novamente
    >- você quer isso? - ela perguntou rindo
    >- é, era ele que eu tava procurando. Vai roubar primeiro?
    >- é uma biblioteca, eu não preciso roubar.
    >- você não devolve os filmes.
    >- mas devolvo os livros, e quer saber? Eu não te devo satisfação nenhuma.
    >ela simplesmente foi até a bibliotecária com o livro
    >- ei, o livro! - eu gritei
    >- eu vi primeiro… - ela disse, piscando o olho para mim antes de falar com a bibliotecária
    >bem, eu não podia simplesmente tomar dela
    >tecnicamente ela tinha o direito de pegar o livro, ela viu primeiro
    >eu precisava pensar em algo
    >então decidi segui-la
    >assim que ela saiu da biblioteca eu saí também
    >tentei manter distância durante todo o percusso
    >ela seguiu por um caminho que passava por um parque
    >depois ela deu a volta por um condomínio próximo
    >tinha um campo verde enorme
    >tinha muito verde pela frente, e depois do verde tinha a areia, as pedras e o mar
    >ela estava saindo da cidade
    >e pior, pela pista
    >eu a segui, mas se ela olhasse para trás me veria
    >não tinha onde eu me esconder, eu não ia me esgueirar por árvores feito um imbecil
    >o “passeio” deve ter durado meia-hora
    >no meio do caminho ela finalmente teve a ideia de olhar para trás
    >- você consegue chegar lá sem morrer? Tá suando e respirando igual a um porco há uns quize minutos.
    >ela sabia o tempo todo que eu estava seguindo ela
    >eu devia ter previsto isso
    >- não quer saber por que eu tô te seguindo?
    >- não, eu não ligo pra você.
    >um bom tempo depois finalmente chegamos no litoral
    >eu não fui até as pedras, pois a água estava batendo nelas e eu ia me molhar
    >mas ela foi até lá, mesmo com o livro
    >- cuidado para não molhar o livro! - eu gritei, irritado
    >- isso não é problema seu. - ela respondeu
    >ela conseguia ser mais irritante que qualquer pessoa que eu já conheci
    >mas eu tinha um bom plano
    >ou ao menos um que ia servir por agora
    >tentaria chantagear ela com a dívida dos DVD’s
    >- você tá me ouvindo? - gritei
    >- não! - ela gritou de volta
    >não sei se ela pensou que isso seria engraçado
    >tanto faz, eu simplesmente fui para mais perto dela
    >- eu preciso do livro. - eu disse
    >- é, eu também.
    >- sério, eu tenho uma atividade no colégio valendo ponto, e preciso dele.
    >- não tô te ouvindo direito, por que você não vem mais pra perto?”
    >eu me aproximei ainda mais, por algum motivo, mesmo sabendo que ela só tava curtindo com a minha cara
    >- por favor, eu preciso desses pontos.
    >ela se levantou da pedra onde estava sentada
    >- vem aqui pegar…
    >- eu não vou jogar esse tipo de jogo!
    >- foi o que eu pensei – ela disse, se sentando outra vez
    >aquilo soou como um desafio para mim
    >tomei coragem e fui até lá
    >- é assim que vai ser? - eu perguntei
    >ela se levantou rindo, e me encarou esperando que eu tentasse pegar o livro
    >eu fui na direção dela, e ela fez a coisa mais doida que alguém já ousou fazer comigo
    >ela simplesmente me empurrou e eu caí no mar
    >mas tinha um problema: eu não sei nadar
    >eu comecei a me debater na água, enquanto subia e descia várias vezes
    >não era o que eu estava planejando para a minha sexta-feira
    >há uma semana ela tinha trocado adesivos de DVD’s da locadora em que eu trabalho, e eu achei isso radical
    >ela ficou rindo de mim, talvez achou que eu estivesse sendo dramático
    >ou talvez ela só fosse uma psicopata do caralho
    >felizmente ela não era, pois quando percebeu que era sério, parou de rir no mesmo momento
    >ela se jogou na água e me ajudou
    >que ótimo, agora eu fui salvo pela pessoa que eu pretendo tomar um livro
    >se eu tinha algum resto de dignidade, eu perdi naquele momento
    >- você tá bem? - ela perguntou
    >eu não consegui responder
    >- é, acho que eu vou ter que fazer respiração boca a boca…
    >nesse momento meu coração disparou
    >- brincadeira! - ela disse rindo, e então deu um murro na minha barriga
    >eu tossi e depois cuspi toda a água que tinha engolido
    >- se as pessoas soubessem que isso funciona, os filmes de romance iriam perder a magia – ela disse se levantando.
    >o quê? Você pensou que iríamos nos apaixonar depois dela salvar minha vida?
    >eu já te avisei que isso não é um romance clichê
    >mas o fato de que eu entrei em uma euforia anormal quando ela sugeriu respiração boca-a-boca me deixou intrigado
    >mas acho que não tem problema nenhum com isso, ela era bonita e ia me beijar
    >não é como se eu sentisse algo por ela ou coisa assim
    >enfim
    >depois disso eu me levantei e olhei para a minha roupa
    >eu definitivamente preferia ter morrido afogado
    >eu tava completamente encharcado
    >- você não sabe nadar… - ela comentou, rindo
    >- você acha? - eu disse, enquanto parti para cima dela para pegar o livro de novo
    >diplomacia não é o forte dela, eu devia saber
    >ela fugiu de mim por um tempo, e parecia estar se divertindo com isso
    >até que eu finalmente a agarrei pelo braço
    >qualquer pessoa que visse aquilo pensaria que era um casal curtindo
    >nesse momento nos encaramos olho no olho
    >só então eu percebi o quanto ela era bonita
    >é óbvio que eu já tinha reparado que ela era bonita, mas… ela era MUITO bonita
    >mas eu esqueci isso no mesmo momento, porque para meu desespero ela simplesmente jogou o livro no mar
    >- você não fez isso… - eu olhava para o mar, incrédulo
    >eu percorri de uma biblioteca até uma porra de praia, por um livro que ela tinha acabado de jogar na água
    >- você deve querer muito esses pontos… - ela disse rindo, enquanto olhava para o mar também
    >por um momento eu tive vontade de matar ela
    >bem, ninguém tava vendo, então seria uma bela oportunidade
    >- por que? - eu perguntei olhando para ela, desesperado
    >ela deu de ombros
    >- você é sempre assim tão… monótono?
    >- monótono? Você acha que só porque eu não roubo DVD’s e jogo livros no mar eu sou monótono?
    >- se eu fosse você, eu teria depressão…
    >okay, eu entendo que ela não teve a intenção
    >mas doeu tanto quanto aquele murro na barriga
    >ela percebeu que eu fiquei mais sério depois que ela falou isso
    >- você não tem depressão, tem?
    >eu respirei fundo
    >- é melhor juntar dinheiro, sua ladra maluca! - eu disse apontando o dedo na cara dela – porque você tem uma multa muito cara para pagar lá na locadora
    >- eu não vou pagar nada e você sabe disso.
    >- vamos ver! - eu disse, e fui embora
    >eu estava com muita raiva dela
    >ela tinha ultrapassado todos os limites
    >falar da minha depressão foi o fim da picada
    >- ei, idiota! - ela gritou, mas eu não olhei para trás
    >ela tentou me acompanhar
    >- sai de perto de mim! - eu disse, apontando para longe
    >- eu sei onde conseguir outro livro daquele.
    >eu parei
    >meu orgulho não queria deixar, mas eu precisava do livro
    >- eu tô ouvindo – disse, cruzando os braços
    >- em outra biblioteca – ela disse rindo
    >- você é uma idiota…
    >segui meu caminho, me concentrando em não quebrar meu código de honra: não bater em mulheres
    >- você é um bebê chorão! - ela gritou, já longe
    >- essa foi a coisa mais imatura que eu ouvi em anos! - gritei de volta
    >- chorar é mais imaturo ainda!
    >eu ignorei, apenas segui meu caminho
    >eu tinha o fim de semana para conseguir outro exemplar de 1984
    >mas aquilo não ia sair barato, literalmente não, ela ia pagar por isso… e pelos DVD’s
    .
    >sábado de manhã
    >estou em minha cama olhando para o teto
    >somos 7 bilhões
    >em um universo de uma vastidão… do caralho
    >que existe há… muito tempo
    >muito tempo mesmo
    >e que provavelmente vai existir por mais tempo ainda
    >eu não sou nada
    >eu morrerei e serei esquecido por todos
    >cairei no limbo do universo
    >as pessoas que me amam vão superar, e seguir em frente
    >e quando elas morrerem, não terá sobrado nada de mim nesse mundo
    >nem mesmo as lembranças, pois não tem ninguém mais vivo que se lembre de mim
    >ah, a propósito: bom-dia
    >niilismo existencial, sabe como é
    >enfim
    >eu tinha que encontrar um exemplar de 1984
    >e falar com meu avô sobre a ladra
    >minha cabeça doía só de me lembrar dela
    >finalmente criei ânimo para levantar
    >antes mesmo de tomar café fui falar com meu avô
    >- vô, temos um problema lá na locadora.
    >- o que aconteceu? Algo deu errado?
    >- não, não, não é isso. Bem, é que… tem um cadastro lá, de uma pessoa, e ela tem 13 filmes que pegou há muito tempo, e ainda não devolveu. E ela p…
    >antes de terminar, lembrei que não podia falar que ela pegou mais 3, pois eu tinha acobertado isso
    >- e ela… ela não aparece pra devolver, sabe?
    >- qual o nome do cadastro?
    >- Ágata Vila-Flor.
    >meu avô riu
    >- ah, não se preocupe com isso!
    >- quê? M-mas, por que?
    >- apenas deixe isso pra lá, não vale seu tempo. Vá se divertir garoto, hoje é sábado!
    >aquilo foi estranho pra caralho
    >eu tinha que fazer algo a respeito
    >ela tinha que pagar pelas merdas que fez
    >mas agora não tinha nada que eu pudesse fazer, pelo visto
    >o melhor a ser feito era eu tratar de providenciar o livro
    >tinham outras 2 bibliotecas na minha cidade, todas bem longe
    >tudo bem que eu fui parar fora da cidade no dia anterior, mas na verdade esse era um bom motivo para eu não fazer nada parecido hoje
    >estava extremamente cansado
    >resolvi que ia jogar tudo pro alto
    >passei a manhã inteira assistindo uns desenhos que estavam passando na televisão
    >depois passaram alguns programas chatos até que eu encontrei um daqueles filmes oitentistas de ação bem mal-dirigidos
    >fiz isso até dar meio-dia
    >almocei tranquilamente, como se nada estivesse acontecendo
    >foda-se a resenha daquele livro idiota
    >foda-se os filmes que a ladra roubou
    >depois do almoço fui para meu quarto novamente
    >joguei video-game por horas à fio
    >até que uma pedra caiu no chão do meu quarto
    >só tinha uma explicação: alguém jogou ela na janela
    >eu fui olhar na janela e uma pedra acertou meu olho
    >puta que pariu
    >era a ladra de filmes
    >- Rapunzel, jogue suas lindas traças para mim! - ela disse, sempre com aquele tom de deboche dela
    >- que porra cê tá fazendo aqui? Aliás, como você sabe onde eu moro?
    >- você vai descer ou não?
    >eu não respondi, apenas fechei as janelas
    >de repente eu ouvi do meu quarto alguém batendo na porta da casa
    >era ela de novo
    >antes que eu pudesse gritar pro meu avô não atender, já era tarde demais
    >- pois não? - meu avô perguntou, inocente
    >- oi, eu sou uma amiga do seu neto, ele tá ai?
    >- ah sim, claro, minha jovem! Pode ir entrando…
    >puta que pariu… puta que pariu duas vezes
    >- ele está enfonado naquele quarto dele, fique à vontade.
    >- obrigado – ela respondeu com um sorriso gentil para ele
    >que garota encantadora
    >ou ao menos deve ter sido isso que meu avô pensou
    >mas eu sei bem o que essa maluca é
    >eu fiquei encostaod na porta, esperando ela subir as escadas
    >- seu avô é um fofo – ela respondeu, e passou por mim entrando no quarto
    >- sim, pode entrar! - eu falei ironicamente, e entrei no quarto também
    >ela fechou a porta e jogou uma mochila na cama
    >- o que você tá fazendo aqui? - eu perguntei
    >ela se sentou na minha cama e olhou ao redor
    >- seu quarto é legal, e você tem uma televisão nele
    >- você não respondeu minha pergunta
    >- isso é um PlayStation? - ela disse, ligando meu console
    >- eu estou esperando uma resposta…
    >- aposto que eu ganho de você em qualquer jogo! - ela disse
    >- tá, legal, agora me diz o que você veio fazer aqui.
    >ela foi até a mochila e pegou um livro
    >era o livro que eu precisava, 1984
    >ela me entregou o livro na mão
    >- se você pensa que isso muda alguma coisa…
    >eu fui interrompido
    >mas dessa vez não por uma das maluquices dela
    >quer dizer, de certa forma sim
    >ela simplesmente me beijou
    >foi um beijo bem longo, e eu demorei pra assimilar o que tava acontecendo
    >quando finalmente pensei em reagir ela parou
    >- tá legal, o que foi isso?
    >- você beija mal – ela disse, pegando o joystick para jogar
    >- mas eu nem tava… esquece! Você é maluca!
    >ela riu, enquanto começou a jogar
    >- Final Fantasy é coisa de frutinha, não tem nada melhor aí não?
    >que idiota, FF é uma das melhores sagas de jogos que existem
    >ela pegou meu disco de Metal Gear Solid
    >- isso sim é um jogo bom!
    >eu não sabia como mandá-la embora
    >eu tinha esse direito, eu sei que sim
    >mas era muito estranho, como falar “vai embora do meu quarto”?
    >ainda mais pra uma garota
    >uma garota que tinha acabado de me beijar
    >decidi que simplesmente ia ver onde isso ia parar
    >péssima ideia, 18:00h da noite e ela ainda não tinha ido embora
    >- esse livro não é roubado, é? - eu perguntei, segurando-o
    >- você não devia estar fazendo uma resenha dele?
    >- não, eu faço amanhã.
    >- não, você faz hoje. Amanhã vamos sair!
    >- o quê? Como assim, você não me convidou pra lugar nenhum, e nem eu… droga, dá pra você me explicar o que tá acontecendo?
    >- você é divertido, e eu quero sair com você, é isso. Não é óbvio?
    >eu respirei fundo
    >qual é o problema dessa garota?
    >ela fugiu de mim por uma semana
    >quase me matou afogado
    >e agora entra no meu quarto, me beija, joga meus jogos e praticamente ordena que eu saia com ela?
    >eu queria ter o auto-confiança dela
    >nem sei o motivo, mas simplesmente fui fazer a resenha do livro
    >as vezes eu parava pra observar ela jogando
    >ela era muito boa nisso
    >mas que porra! Há algumas horas atrás eu estava planejando fazer ela pagar uma multa caríssima e me vingar da raiva que ela me fez passar
    >e agora ela tá sentada na minha cama
    >eu bem que podia jogar ela da janela e dizer que foi um acidente
    >na verdade eu deveria ter feito isso, como descobri mais tarde
    >pois deu a hora do jantar e ela ainda estava lá
    >- O jantar tá na mesa! - minha mãe gritou da sala de jantar
    >eu nem tinha visto ela chegar
    >- finalmente! Eu já tava com fome – ela disse, e largou o joystick de lado
    >ela ia jantar na minha casa
    >ela… ia… jantar… na… minha… casa
    >puta que pariu pela terceira vez
    >eu demorei pra sair do quarto
    >conseguia ouvir ela falando com minha mãe
    >ela tinha um carisma do caralho
    >dava pra ver que as duas estavam se entendendo super bem
    >tipo, nem foi como “quem é essa garota que eu nunca vi antes?”
    >quando eu desci, as duas estavam conversando sobre Casablanca
    >um filme muito bom inclusive, recomendo
    >minha mãe também gostava de filmes antigos, por causa do meu avô
    >meu pai passou o jantar inteiro me olhando com aquele jeito tipo “boa, filhão!”
    >eles tavam pensando que ela era a minha namorada
    >- então, há quanto tempo vocês se conhecem? - minha mãe perguntou
    >- há umas duas semanas, e ele passou esse tempo todo tentando me conquistar – ela disse, me olhando de um jeito desafiador
    >minha mãe riu, meu pai continuava minha olhando igual a um idiota
    >meu avô agia como se nada estivesse acontecendo
    >aquela seria uma longa noite
    >e eu tentava achar um motivo pra não gritar “EU NÃO CONHEÇO ESSA DOIDA, ELA SIMPLESMENTE ENTROU NA MINHA VIDA E FEZ UM MONTE DE MALUQUICE E EU NÃO QUERO VER ELA NUNCA MAIS! ALGUÉM FAZ ALGUMA COISA!”
    >se bem que de alguma forma, agora eu já não estava tão desesperado assim
    >meu avô por algum motivo não se importa com os filmes
    >e eu desconfio que ele já conheça ela
    >e apesar de eu não estar muito afim de ver a cara dela, acho que a minha raiva passou
    >eu consegui fazer a redação, no fim das contas
    .
    >por sorte, não aconteceu nenhum desastre no jantar
    >apesar de que ela fez parecer que eu sou louco por ela para os meus pais
    >depois disso, ela finalmente foi embora
    >minha mãe foi fazer um daqueles comentários constrangedores
    >- ela é muito bonita e inteligente, você deve gostar muito dela.
    >eu ignorei, fui direto falar com meu avô em particular
    >- certo, vô, me explica o que tá acontecendo… - eu falei
    >- o quê? Como assim?
    >- você conhece ela de algum lugar? Por que você não liga pro registro com os 13 filmes não devolvidos?
    >- você se importa mesmo com isso?
    >- bom, sim, né…
    >ele riu
    >- sabe, quando eu era jovem, eu ia para o cinema assistir as matinês de faroeste que tinham no domingo - disse meu avô, sentando-se em sua poltrona
    >aquilo ia ser interessante, pelo visto
    >- mas eu não tinha dinheiro para assistir essas matinês todo domingo. Então eu ia até o porteiro, dizia que meu pai estava lá e precisava falar com ele, entrava e assistia.
    >- e ele caia nisso? – eu perguntei, achando aquilo ridículo
    >- claro que não! - ele respondeu rindo – Mas ele não se importava, ele deixava por pura vontade.
    >à essa altura, já tinha entendido onde ele queria chegar
    >- quando essa garota apareceu pela primeira vez, há mais ou menos um mês, eu a vi trocando os adesivos dos filmes – ele continuou – eu ia chamar a atenção dela, mas então eu vi a cena mais bonita em todo o tempo que trabalhei ali: ela tinha pego um filme do Charles Chaplin. Uma garota de uns 16 anos, em pleno século XXI, pegando um filme de Chaplin!
    >eu estava começando a me sentir mal por querer fazer ela pagar a multa
    >- eu não sei qual a condição financeira dessa garota, mas acontece que ela ama cinema, e ela faz o que faz, por causa disso, exatamente como eu fazia. Eu sou o porteiro agora, entende? Eu sei o que ela faz, mas eu também sei o motivo. E isso faz com que eu não me importe.
    >- então ela pode pegar filmes à vontade?
    >- é, ela pode. Apenas faça parecer que você não sabe, isso é importante.
    >- certo.
    >- agora, como eu já tinha dito, vá se divertir. É sábado!
    >meu avô sorriu e então se levantou, indo para o seu quarto
    >- boa noite.
    >- boa noite, vô.
    >agora eu me sentia um idiota
    >um completo idiota
    >essa é provavelmente a garota mais incrível (e maluca) que eu já conheci
    >a verdade é que eu não mereço ela
    >eu não mereço a amizade dela
    >eu não mereço a atenção que ela me dá
    No dia seguinte…
     
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  2. xBruxaoZera

    xBruxaoZera Excelente
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  3. AziRESPEITA

    AziRESPEITA Neutro
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